in Revista Internacional de Folkcomunicação
Manifestações culturais midiáticas como vetores à superação de crise econômica local e regional
Resumo
Este artigo destaca a importância do uso do folkmarketing no contexto empresarial e da necessidade de as organizações gerirem o marketing cultural em cenários de negócios para superação de crises econômicas em espaços locais e regionais. Trata-se de um estudo bibliográfico, que analisa a evolução de estratégias empresárias no sistema de monitoramento dos resultados da empresa. O Folkmarketing, recorte da teoria da Folkcomunicação, parte do pressuposto de que as manifestações culturais agregam valor à comunicação da organização frente ao público-alvo e por consequência impetram prerrogativa mercantil.
Main Text
Introdução
A multinacional Coca-Cola, em sua embalagem tradicional, utiliza a cor vermelha em todos os países que comercializa o refrigerante. No entanto, ela modificou seu principal produto por força de uma das torcidas do Festival Folclórico de Parintins3 (AM), a do boi Caprichoso, ofertando para a cidade uma embalagem do refrigerante na cor azul – cor tradicional utilizada pela concorrente Pepsi. Para atender toda a população local (ilha nortista brasileira), manteve também, a comercialização do refrigerante Coca-Cola na versão original para agradar ao público do boi rival, o Garantido. Embora com restrições, a comercialização só acontece durante o Festival e com limitação de não sair da ilha, a decisão da multinacional decorre de um evento cultural, o Carnaval de Parintins, onde a torcida do Garantido passou a dar preferência ao refrigerante Pepsi-Cola porque na embalagem da Pepsi a cor azul predomina.
Não se tratava apenas de uma adaptação, como é o caso da embalagem desse mesmo produto para os torcedores do Grêmio Foot-Ball Porto-Alegrense. Trata-se de uma alteração na logomarca da organização, o que significa ir além das práticas convencionais de mercado.
Nesse caso, a empresa se apresenta na cor da concorrente Pepsi para agradar um público bastante limitado. A embalagem na cor vermelha estava sendo consumida apenas pelos torcedores do bumbá rival, Garantido, razão pela qual a empresa realizou tal oferta. Tal fato requer um estudo científico mais aprofundado em comunicação e marketing cultural (SANT’ANNA, 2005) em cenário de negócios. Também em Parintins, a instituição financeira Bradesco e a loja de conveniência Americanas, que possuem logomarca na cor vermelha, apresentam suas fachadas na cidade sede do Festival, também na cor azul.
Com esses e outros questionamentos, a investigação leva em consideração que no sistema de comunicação há muitas variáveis a serem investigadas, a exemplo do imaginário popular, dos sistemas de representações simbólicas e das práticas culturais. É muito mais que publicidade, jornalismo ou relações públicas. É educação, administração, marketing, gastronomia, turismo e tudo mais que envolve comportamento humano.
Ganha destaque também a valorização dos bens simbólicos, além dos hábitos, costumes, modus operandi e vivências de determinada comunidade, que se apresentados na comunicação mercadológica possibilitam maior alcance ao objetivo principal da mensagem, tornando possível um feedback satisfatório. O emissor não detém o poder da interpretação, condição absoluta do receptor.
Consequentemente, não há possibilidade de se transmitir a mensagem com excelência sem considerar a língua, a linguagem e a fala que é decodificada pelo receptor, por determinada sociedade. Ademais, apesar de existirem várias pesquisas sobre cultura, são poucas com recorte para negócios porque os culturalistas não falam em “transmissão” (paradigma da transmissão). Em geral, fala-se em “compartilhamento de sentidos”, “produção de sentidos” (paradigma da interação).
Estamos vivendo uma Era de Compartilhamento, no sentido de a humanidade caminhar para o desenvolvimento de um novo sistema econômico: o cooprodutivismo. E a comunicação deve ser constituída de interação recíproca entre autor e leitor, considerando seus conhecimentos, suas experiências e seus valores.
A sociedade não é determinada por uma quantidade pré-estipulada de pessoas, senão pelo propósito de organização de um grupo para melhor produzir seus parâmetros de valores e condutas, apresentados em seus hábitos e costumes – culturas. Esse comportamento pode proporcionar melhor convivência entre os indivíduos, facilitando, inclusive, a interação entre sociedades distintas.
Como o comportamento humano é digno de ser estudado, vale discutir o modo de viver de cada sociedade, que possui relação direta com a cultura. Que não se resume apenas a expressões de pequenos mundos. Se a cultura é a grandeza do processo social, deve ser entendida de modo a resolver as particularidades. Na Amazônia Legal, as influências indígenas estão muito presentes e, assim, cada pedacinho da sociedade deste país, que é o quinto maior do mundo em área territorial, tem uma característica particular.
Embora seja o maior país lusófono do planeta, é uma das nações mais multiculturais e etnicamente diversas do mundo em decorrência da forte imigração oriunda de variados locais do mundo. Em outras palavras, a cultura brasileira é o resultado da miscigenação de diversos grupos étnicos que somam quase 215 milhões de habitantes[4], nas 27 unidades da República Federativa do Brasil. Por isso apresenta grande diversidade cultural, manifestada na religião, música, na dança, na alimentação, na arquitetura, no vestuário etc. Deste modo, podemos entender que a comunicação e cultura são indissociáveis também para as organizações. Compreender o universo cultural do indivíduo ou da comunidade que receberá a mensagem é essencial para assegurar uma comunicação mercadológica inteligível, relevante e assertiva.
No decorrer da pesquisa, amparada pela teoria folkcomunicacional que se posiciona na fronteira entre o folclore e a comunicação de massa, a ferramenta do folkmarketing, cuja gênese são os festejos midiáticos, possibilitou ampliação dos estudos inicialmente sob as lentes do turismo e da gastronomia, para o mundo dos negócios como um todo: produtos, bens e serviços.
Assumindo papel importante na contextualização do novo cenário mercadológico, inclusive o digital, Folkcomunicação e Folkmarketing são conceitos brasileiros e se caracterizam pela utilização de estratégias de difusão simbólica capazes de expressar em língua, linguagem e fala popular, mensagens previamente veiculadas pela indústria cultural.
Folkcomunicação
Antes de abordar a temática do Folkmarketing, é necessário revisitar os conceitos de Folkcomunicação. Como denominação inicial, a Folkcomunicação se deu como disciplina acadêmica, criada pelo então professor Luiz Beltrão de Andrade Lima, que, ao estudar os ex-votos (pagamento de promessas), percebeu as manifestações culturais folclóricas como forma de comunicação das classes populares (principalmente), sem intermédio dos meios tradicionais de comunicação de massa. Essa percepção originou sua tese de doutorado, intitulada Folkcomunicação: Um estudo dos agentes e dos meios populares de informação de fatos, expressão e de ideias (BELTRÃO, 2014), que tinha como objetivo o estudo da comunicação popular e o folclore na difusão de meios de comunicação de massa, atualmente teoria da comunicação.
Após conquistar espaço na academia, essa teoria cresceu em conceito e amplitude de pesquisas e ganhou recortes cujos termos estão listados na Enciclopédia Intercom de Comunicação (ENCICLOPÉDIA..., 2010). São eles: Folkcomunicação Cinética; Folkcomunicação e Educação; Folkcomunicação e Etnografia; Folkcomunicação e Extensão Rural; Folkcomunicação e Patrimônio Cultural; Folkcomunicação e Sociologia Rural; Folkcomunicação Icônica; Folkcomunicação Oral; Folkcomunicação Política; Folkcomunicação, Internet e Lendas Urbanas; Folkcomunicação, Turismo Religioso e o Ex-voto; Folkcomunicação Visual; Folkmarketing Ideia Inicial; Folkmarketing Multiplicando o Conceito e Folkmídia.
A palavra “folclore” vem de folk-lore, um termo de raiz saxofônica, no qual folk significa “povo” e lore “saber”. Essa expressão, portanto, pode ser entendida como “sabedoria do povo” ou, em outras palavras, “sabedoria popular”. O 7º Congresso Brasileiro de Folclore (Brasília, 1974) fez um estudo para atualizar o termo, definindo-o como um
Ainda de acordo com o principal pesquisador dos estudos das culturas populares no Brasil, Roberto Benjamin[5] (2022, p. 2), o folclore se moderniza conjuntamente com a sua comunidade e com a criatividade do povo que o experimenta: “[o] folclore é espontâneo, não se aprende de modo institucionalizado”. Se para alguns teóricos o folclore é entendido com uma riqueza local, essa riqueza deve gerar retorno financeiro para quem a explorar – não no sentido negativo ou pejorativo dessa palavra, mas sim no seu sentido amplo de percorrer a região, de pesquisar e conhecer o território, assim como os hábitos e costumes das comunidades.
Podemos abarcar a teoria genuinamente brasileira para além dos estudos da cultura popular e do folclore. No entendimento de Laraia (2009), a cultura cria símbolos que são utilizados para a continuação e a propagação de costumes. A cultura não é homogênea, mas sim variada, e se modifica com o tempo, conforme a região. Compreender a cultura auxilia os teóricos a entenderam as diferenças e identidades da população. A cultura popular, está no centro da vida cotidiana (GODOY; SANTOS, 2014). Se a cultura é o primeiro fator de decisão de compra de uma sociedade, aproveitar suas características próprias para desenvolver comunicação assertiva é algo no mínimo interessante para o coletivo, independentemente do cenário – seja político, seja social, seja mercadológico.
A Folkcomunicação surgiu durante a ditadura no Brasil, quando os pensamentos e ideias populares eram reprimidos pelo governo militar. O jornalista e escritor brasileiro criador do termo, Luiz Beltrão, relatou em suas pesquisas que as expressões populares tinham a mesma importância que as ideias difundidas pela cultura de massa.
Ou seja, Beltrão, em preterimento ao pensamento americanizado, transporta o olhar comunicacional para o Nordeste brasileiro, precisamente sobre as lentes de uma região à época com alto índice de analfabetismo e atraso no que se refere ao desenvolvimento econômico e social. Ele se preocupou em demonstrar sua abordagem de forma teórica a partir de estudos empíricos.
Os estudos sobre a Folkcomunicação foram um dos principais legados de Beltrão, em sua refrega para conscientizar os estudantes de jornalismo quanto à comunicação coletiva e a seus múltiplos desdobramentos. A atualidade da pesquisa desse pioneiro tem despertado o interesse de diversos grupos, não só no Brasil, mas também na América Latina e em países europeus.
Junto à origem da teoria, surge o termo “folkcomunicador”, agente responsável por desemaranhar os códigos da cultura popular de uma determinada região de tal modo que possa transmitir uma mensagem inteligível à audiência, inclusive a externa. É fundamental que tal comunicador seja capaz de fazer essa tradução e implantá-la na mensagem, pois palavras, expressões, verbalizações, símbolos, etc. podem ter significados e significantes distintos para determinados povos ou sociedades.
O conceito “Folkcomunicação” passou a ser ampliado e difundido à medida que pesquisas no universo acadêmico foram se aprofundando na temática. Hohlfeldt (2002, p. 25) descreve a Folkcomunicação “como estudo dos processos de comunicação pelos quais as manifestações da cultura popular ou do folclore interagem com outras formas de comunicação, e sofrem influências ou se modificam quando tomadas de empréstimo por complexos comunicacionais”. Pesquisadores da rede folkcomunicacional (Rede Folkcom) entendem que a teoria ocupa um papel de mediação entre a cultura popular e a cultura de massa nos estudos acadêmicos.
Os estudos folkcomunicacionais não são exclusivos do campo protocolar da comunicação; caminham nos mais diversos ambientes. São associações entre os conceitos tradicionais das Ciências Sociais (teoria) e o entrosamento das tradições populares (experiência). Também são encontrados em grupos sociais que são excluídos da cultura de massa e dos meios de comunicação de massa. Embora haja grupos que se relacionam com a sociedade de massa, sua cultura é desviada e marginalizada pela dominante no cenário (CAMPOS; SILVA; POSTALI, 2017).
José Marques de Melo, discípulo de Beltrão, é um dos nomes mais representativos no cenário internacional dos estudos científicos da Comunicação. Em seu primeiro livro, Comunicação Social: teoria e pesquisa (1970), o professor destaca o sistema da Folkcomunicação e elenca temas para formar a Teoria Brasileira da Folkcomunicação. A obra apresenta um conceito mais pontual da Folkcomunicação de Beltrão, uma vez que a teoria da Folkcomunicação, descrita em sua tese de doutoramento, estava essencialmente atrelada ao Jornalismo. A partir desse brocado, recortes “Folk” começaram a surgir, conforme pontuado anteriormente. Dentre eles, destaca-se, para este estudo, o folkmarketing.
Folkmarketing
A cultura brasileira é rica e diversa, o que se explica pela formação geográfica e histórica do país, e indígenas, africanos e portugueses contribuíram muito para essa construção. Para além dos colonizadores, também tivemos muitos imigrantes. A vastidão cultural brasileira deve-se, em primeiro lugar, ao fato de que vários povos migraram para o nosso país em fluxos variados.
O principal motivo da vinda desses imigrantes foi a falta de emprego provocada pela Revolução Industrial a partir dos séculos XVIII e XIX, pois o avanço tecnológico das máquinas dispensou grande parte do trabalho humano nas fábricas em várias partes do mundo.
Os impactos dos avanços tecnológicos proporcionados pela Revolução Industrial e o capitalismo no mundo das artes passaram a ser investigados na academia, resultando no conceito de indústria cultural, desenvolvido por Theodor Adorno e Max Horkheimer durante o mesmo período. Segundo Marques de Melo (2006), muitos produtos típicos do entretenimento resgataram símbolos populares e os submeteram à padronização necessária ao processo de fabricação massiva e seriada, ou seja, houve uma apropriação de bens da cultura popular pela indústria cultural.
Toda essa vastidão de povos provocou a formação de uma cultura plural no Brasil. Em um país miscigenado como o nosso, com uma grande população e um vasto território, a cultura tende a ser rica e ampla. Nesse sentido, podemos nos considerar uma nação privilegiada culturalmente. Na comida, na dança, na música, na literatura, na arquitetura e nas festas e tradições populares, podemos perceber a presença das culturas estrangeiras incorporadas à brasileira. Foi a partir desse cenário dos festejos midiáticos que Lucena Filho, juntamente com seus alunos, realizou a investigação do “Maior São João do Mundo”, em Campina Grande-PB, com o enfoque na comunicação mercadológica, nascendo desse estudo o termo Folkmarketing, composto do termo folk (“povo”) aliado à palavra “marketing”.
Se a sociedade brasileira é bastante variada, não é muito assertivo usar as lentes da nacionalidade para se desenvolver uma comunicação eficiente e eficaz do ponto de vista mercadológico.
As regiões brasileiras possuem particularidades que chegam a ser determinantes para atingir seus públicos-alvo, não apenas do ponto de vista dos hábitos e costumes locais como também por condições etnogeográficas. Parece-lhe assertivo vender chimarrão[6] no Maranhão[7]? “Nesse contexto, serão necessárias ações de comunicação específicas, do tipo folkmarketing, com objetivos bem definidos, além da elaboração de uma estratégia adequada à situação local, porém sintonizada com as transformações da sociedade industrial” (FERNANDES, 2010, p. 556).
O calendário nacional é repleto de festejos e atividades culturais midiáticas, que variam em gênero, número e proporção de acordo com o estado, a região e o município, entre outras formações. Baseando-se nessas peculiaridades, os empreendimentos dos negócios, independentemente de seu tamanho e/ou alcance (das multinacionais aos comércios locais), devem compreender a melhor maneira de adentrar os cenários mercadológicos. “A sociedade de consumo, no seu conjunto, resulta do compromisso entre princípios democráticos igualitários, que conseguem aguentar-se com o mito da abundância e do bem-estar, e o imperativo fundamental de manutenção de uma ordem de privilégio de domínio” (BAUDRILLARD, 2005, p. 52).
O marketing está diretamente relacionado à dinâmica social, mas, diferentemente do que pensa a massa, marketing não é sinônimo de vendas. Seu conceito maior é a definição de que o marketing contempla toda a atividade de comercializar, ou seja, o antes, o durante e o pós-mercadoria. Logo, conforme as sociedades caminham e atravessam suas etapas rumo ao progresso, novos arranjos são definidos a partir de suas características específicas e não param de surgir na medida em que são estabelecidas as mudanças. Para acompanhar esse desenvolvimento, os estudos na área também avançam, assim como as pessoas, as sociedades mudam e/ou se transformam.
De acordo com o “pai” do marketing, Kotler, juntamente com Keller, “[o]s profissionais do marketing devem conhecer o comportamento de compra do consumidor tanto na teoria como na prática” (KOTLER; KELLER, 2006. p. 172). Entretanto, grande parte dos profissionais de marketing, estejam eles dentro das agências de propaganda ou fora delas, pelo curto prazo para elaboração, pela insuficiência de orçamento para pesquisas ou por falta de conhecimento, ignoram o conhecimento pontual sobre o público ao qual se destinam. Por isso, acabam por utilizar suas intuições baseadas na experiência de mercado, caminhando rumo à generalização da comunicação. Aqui o folkmarketing faz-se ferramenta indispensável no cenário dos negócios.
O processo de comunicação envolve emissor, mensagem, canal e receptor. Ou seja, o ato ou efeito de comunicar é a capacidade de partilhar, participar ou tornar comum. Para tal, o comunicólogo deve ser claro e consistente e basear-se em fontes confiáveis. Além disso, ser respeitoso, colaborativo e empático é uma postura fundamental para escalonar com velocidade a informação correta, bem como uma linguagem e respostas únicas para os públicos tornam o processo de comunicação mais assertivo. Sendo assim, adaptar a comunicação conforme o público é mandatório.
O profissional de comunicação tem obrigação de conhecer o público-alvo e desentranhar-se de seus julgamentos (pré)concebidos para entranhar-se nos hábitos e costumes da comunidade a qual deseja chegar. Se o marketing pode ser considerado um conjunto de processos que visa criar, comunicar, entregar e trocar ofertas que gerem valor ao cliente e à sociedade (MINUZZI; LARENTIS, 2014), também os grupos marginalizados devem ser lembrados e entendidos como audiência, cliente e consumidor de produtos, bens e serviços, embora normalmente sejam desconsiderados na sociedade consumidora. Em outras palavras, esses grupos também são receptores do processo comunicacional mercadológico.
O emissor deve atentar-se ao fato de que o receptor irá interpretar a seu modo a transmissão da informação, interpretação essa que partirá das próprias experiências do receptor. A audiência não será atingida como por uma flecha para tal, e o discurso precisa estar alinhado ao seu público e à sua forma de pensar. A maneira de se comunicar, portanto, deve estabelecer conexão entre as duas partes: emissor e receptor. A partir desse entendimento, é possível afirmar que o profissional que trabalha com as lentes da ferramenta do Folkmarketing é capaz de decifrar os códigos de dada comunidade (receptor) e assim oferecer uma comunicação assertiva combinada ao mundo dos negócios.
A primeira citação do Folkmarketing foi feita em um livro do Banco do Estado de Pernambuco (Bandepe), que abordava a temática da comunicação organizacional. Era um case da dissertação de Severino Alves de Lucena Filho (1998), cuja denominação inicial, bem como seu conteúdo, foi criada pelo professor pernambucano. A chegada do Folkmarketing iria aprimorar os trabalhos das Ciências Sociais, em especial às pesquisas voltadas para a comunicação organizacional a partir das estruturas da cultura popular. Esse estudo serviu como ponte para a metodologia e a teoria da Folkcomunicação, transportando conhecimento a respeito das ferramentas da comunicação mercadológica e do marketing para meus estudos.
Empresas nacionais e internacionais tendem a entender os costumes, as tradições locais e as figuras públicas locais (agentes sociais) como ferramentas de exposição e demonstração de seus produtos, bens e serviços. Podemos entender nesse contexto que o marketing para o povo deve conter traços e características do povo e não necessariamente apenas a “cara” da organização. Se não estiver do agrado do público, deve-se customizar a mensagem para que o cliente possa se identificar com o modo como a organização deseja ser percebida. Em outros termos, a comunicação deve ser “do povo para o povo”.
De modo simplificado, Lucena Filho (2007) explica que, se folk nos remete ao povo e marketing ao comercial, o termo Folkmarketing engloba o conceito de ambos, representando desejos/símbolos do povo com enfoque comercial.
O estudo desse processo é relevante para muitas áreas, entretanto as pesquisas no campo do consumo se concentram nas áreas da Administração, do Marketing e da Comunicação. Tais pesquisas requerem atualizações constantes e frequentes, principalmente no que cabe aos aspectos tecnológicos e digitais, que transformam a todo instante o comportamento das pessoas. Isso, por consequência, gera mudanças nas sociedades, exigindo reflexões acerca desses câmbios de pensamento os quais, por sua vez, resultam em atualizações das propostas de marketing.
Do ponto de vista histórico, o marketing começou a ser estudado no momento da Revolução Industrial, quando era primordial se pensar em estratégias de vendas para os produtos produzidos em larga escala. Preceitos passaram a ser sugeridos para os profissionais do mercado, e, a partir de então, surgiram nesse processo alguns pilares para melhor conduzir as ações desses profissionais no mundo dos negócios. Como exemplo, citamos os 4PS (preço, produto, praça e promoção) e, na evolução das pesquisas em marketing, dos 8PS (pesquisa, planejamento, produção, publicação, promoção, propagação, personalização e precisão). Com esse progresso, surge o marketing 3.0, segundo o qual as trocas realizadas pela população vão muito além do aspecto comercial, podendo também serem emocionais ou simbólicas. Esse campo, gênese dos estudos folkcomunicacionais, considera o poder simbólico dos grupos subalternos, que, por prerrogativa da maioria populacional no país, arrastam multidões.
As empresas necessitam deixar de pensar apenas nos números; é preciso também que elas sejam humanizadas, sugere Sato (2011). Com o avanço da tecnologia e a chegada das redes sociais, a qual proporcionou a globalização da informação, os teóricos apresentaram o marketing 4.0. Nessa abordagem, o consumidor final tem acesso direto às marcas e, associados à liberdade de expressão, consegue demonstrar seus gostos e desgostos. A ideia é que o consumidor seja um defensor da marca (KOTLER; KARTAJAYA; SETIAWAN, 2017).
Não existe um único jeito ou uma forma exclusiva de se ter acesso ao consumidor, já que os humanos são maleáveis e têm seus próprios entendimentos e anseios. No entanto, cada cultura, composta de subculturas que fornecem identificação e socialização mais específicas para seus membros, quando se tornam influentes o bastante, deve servir de base para elaboração de programas de marketing específicos para elas. Um relacionamento conquistado com a participação da audiência envolve a questão da troca e o emprego dos elementos culturais que participam das vivências do público-alvo, quaisquer que sejam, podem ser aproximados das estratégias de Folkmarketing.
Lucena Filho (2007) explica que o uso da cultura popular de uma região com fins mercadológicos faz com que a empresa rompa barreiras com o consumidor da região, pois age no campo emocional quando da tomada de decisão do cliente. Isso pressupõe que as pessoas atendem aos seus sentimentos como fonte de informação, com diferentes emoções capazes de fornecer diversos tipos de informação. Assim, ao realizar levantamentos e mapeamentos das culturas regionais, a empresa perceberá melhor o seu consumidor, tornando-se mais assertiva no momento de montar suas estratégias. Do mesmo modo, sublinham Santos, Fagundes e Liberal (2018, p. 123):
Ao mesmo tempo, torna-se imprescindível lembrar a comunicação mercadológica, visto que esta consiste no modo como a empresa faz a propagação de seus produtos, bens e serviços. É uma comunicação que tem a finalidade de transmitir a ideia e não o produto em si. Nessa estratégia, é disponibilizada para o público a informação sobre o produto, serviço e a marca, detalhes apresentados de modo direcionado (PYLORIDIS et al., 2000). Objetivamente, é a maneira como nos remetemos ao produto esponja de aço quando somos convidados a pensar em Bombril, mas nesse caso o campo de estudos já é o Neuromarketing, outro braço do marketing que estuda o comportamento do consumidor a partir das lógicas de consumo, entendendo os desejos, os impulsos e as motivações que levam os indivíduos a optarem por consumir ou adquirir algum produto ou serviço.
Nesse processo (escolha), a empresa entende que a comunicação é uma das etapas da tomada de decisão de sua audiência. Assim, os setores responsáveis por essa comunicação percebem a necessidade de que a informação seja apresentada de maneiras variadas. Dito de outro modo, a comunicação mercadológica é a ponte entre a organização e o consumidor, divulgando as qualidades e os benefícios dos produtos e serviços, de modo diversificado (PYLORIDIS et al., 2000).
Foi possível identificar em nosso estudo que o marketing e a comunicação mercadológica atuam dentro do mercado tradicional de comunicação de maneira a proporcionar adequações e ajustes não apenas na propagação (a divulgação propriamente dita), mas também na elaboração do produto, por vezes dando-lhe nova finalidade quando da renovação do clico de vida do produto. Ainda, como o patrocínio de eventos e atividades culturais agregam valor de mercado à organização, vale o aprofundamento dos estudos em Folkmarketing.
Pensando em trazer a empresa para mais perto do público-alvo, é dentro desse cenário que os estudiosos destacam o folkmarketing e sua atuação como uma ferramenta catalisadora dos elementos que compõem as identidades regionais e locais. Os objetivos são valorizar e manter vivas as tradições locais por meio de seus produtos, assim como a Coca-Cola e outras empresas, apoiadoras do Festival Folclórico de Parintins no Amazonas brasileiro. É preciso pensar em estratégias que integrem o global com o regional. Por essa razão, é primordial se falar em comunicação mercadológica para os públicos dos produtos de luxo ou populares, democratizando a comunicação mercadológica em todas as suas dimensões, sem preconceitos. Afinal, o mundo dos negócios de natureza popular abarca ganhos abastados para as organizações que delas assenhoram-se.
Em uma abordagem mais moderna, devemos entender os estudos de folkmarketing como lentes empresariais aos públicos diversos, a partir do olhar empático de seus hábitos e costumes. Deve ser utilizado para atrair o público local, enviesando a proposta comercial em torno das emoções coletivas com foco na propagação, na manutenção e na valorização da cultura e do pertencimento identitário de determinado grupo social. É algo que para Lucena Filho não pode passar despercebido pelas marcas. O Folkmarketing, destaca o autor, consiste em
Nessa fala, o autor deixa claro que o folkmarketing está efetivamente presente nas práticas de mercado da empresa. Para aplicar esta teoria, é necessário que o agente que acompanha os processos culturais valorize a cultura e a subcultura dos grupos, os quais habitualmente se mostram apaixonados, fiéis e com grande sentimento de pertença. Só então, a partir do conhecimento e da empatia, o profissional que precisa transmitir a informação obterá sucesso em seu pleito, tendo em vista que os mercados e a concorrência não param de crescer. No entendimento de Procópio, Lima e Pereira (2015, p. 104),
As marcas internacionais, nacionais e locais podem utilizar do folkmarketing como vantagem competitiva em seu processo comunicacional de modo a dar visibilidade e agregar valor aos produtos, bens e serviços comercializados. No texto de Silva, Procópio e Paulino (2017), evidencia-se que a cultura tem grande importância e causa impacto em diversos setores, sendo os mais citados o social, o econômico e o ambiental. É vital para o bom funcionamento da sociedade que haja investimento e políticas públicas com vistas à preservação de elementos culturais materiais e imateriais de determinados grupos ou regiões. Ainda, é um direito de todo cidadão, garantido na Constituição de 1988.
Nesse sentido, poder cultural é o entrelaçamento do conceito de “poder simbólico”, desenvolvido pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu (1989), com o conceito de “poder suave” (soft power), do cientista político norte-americano Joseph Nye (2005). Em suma, cultura é poder – e se cultura é poder, para a comunicação que tem como sua matéria-prima a informação, folkmarketing é a palavra-chave para gerar comunicação mercadológica assertiva.
Considerações finais
A função do marketing em uma empresa gira em torno de como uma organização pode entender o mercado e satisfazer suas necessidades e desejos através de produtos e serviços. Dessa forma, deve-se estabelecer um público-alvo por meio de experiências consistentes que envolvam sua marca e o que ela comercializa. Em outras palavras, os estudos de folkmarketing tornam-se indispensáveis para qualquer profissional que atue no campo dos negócios empresariais. É possível afirmar que a empresa, ao fortalecer sua imagem por meio da empatia que estabelece com o público e a sociedade em geral, faz com que suas vendas sejam aumentadas ou que a própria empresa fique posicionada de modo positivo no mercado local e regional, além de seus feitos também alcançarem os cenários nacional e global. Esses posicionamentos podem variar de acordo com os interesses da organização, especialmente a depender da fase do ciclo de vida que se encontra o produto.
Percebemos que existe uma escassez de estudos relacionados ao Folkmarketing. Os pesquisadores que abordam essa temática estão em um grupo restrito, mesmo que o assunto seja multifacetado. Assim, o campo da pesquisa teórica oferece muito espaço para ampliação da discussão acerca do tema, pois ainda é pouco explorado.
As investigações sobre o conjunto de conhecimentos, informações e saberes de um povo são cruciais para os estudos em Ciências Sociais, porque só se faz comunicação assertiva quando o indivíduo se faz entender. Para se fazer entender, é preciso compreender a importância de determinados símbolos para a população – o poder simbólico – e aplicar esse conhecimento na elaboração de produtos, bens e serviços a fim de adaptá-los às necessidades e aos desejos do público.
O Folkmarketing é um recorte da Folkcomunicação que precisa ser conhecido e reconhecido por outras áreas do conhecimento para além da Comunicação, a exemplo dos campos de investigação de Marketing e Administração. A escassez de estudos no campo do folkmarketing abre portas para novas pesquisas em diversas áreas do conhecimento. A recomendação é que pesquisadores de toda e qualquer atividade que envolva o contexto empresarial investiguem a temática, expandindo a importância deste estudo.
Resumo
Main Text
Introdução
Folkcomunicação
Folkmarketing
Considerações finais