A identidade do crime: contribuições da medicina e da antropologia física em Portugal (1880–1940)
DOI:
https://doi.org/10.5212/Rev.Hist.Reg.v.29.23894Palavras-chave:
crime; eugenia; antropologia física; medicina; PortugalResumo
Este artigo pretende trazer um contributo sobre o entendimento de como era feita a identificação das pessoas consideradas criminosas, entre os finais do século XIX e o final dos anos 30 do século XX (período auge das teorias eugénicas) em Portugal. Começa por apresentar alguns exemplos de teorização e práticas associadas à então chamada “antropologia criminal”. Os exemplos apresentados reportam-se à Escola Médico-Cirúrgica do Porto, à Universidade do Porto, a hospitais e a sociedades científicas, como a Sociedade Carlos Ribeiro e a Sociedade Portuguesa de Antropologia e Etnologia. Foram também analisados autores ligados a outras instituições e hospitais, em Coimbra e em Lisboa. No processo de identificação de pessoas, os postos antropométricos tiveram um papel importante, assim como os cursos de “antropologia criminal” nas universidades e as publicações que foram surgindo. Todos estes exemplos acabaram por contribuir para disseminar propostas de reconhecimento, mas também formas de controle e vigilância. O artigo analisa o trabalho realizado por médicos e médicos legistas. Entre os vários exemplos dados, é destacado o trabalho de António Mendes Correia (1888–1960), produzido sobre o tema, tendo em conta as suas concepções teóricas e metodológicas, mas também morais e éticas e o seu interesse pela psiquiatria nos anos 10 e 20 do século XX, que haveria de o conduzir mais tarde para os domínios da antropologia. No final, procura-se explicitar como as elites intelectuais, ao tentarem identificar e compreender comportamentos desviantes, acabaram também por produzir e reproduzir preconceitos.
Referências
Online sources
Identity card, retrieved August 2022 from https://www.jn.pt/nacional/bilhete-de-identidade-nasce-com-a-republica--1535340.html
Legislation on Anthropometric Posts, retrieved December 2011 from http://digitarq.cpf.dgarq.gov.pt/details?id=39150
Legislation on Anthropometric Posts, retrieved December 2011 from http://www.redeconhecimentojustica.mj.pt/Category.aspx?id=78
Primary sources
BASTOS, Álvaro Teixeira. A tatuagem nos criminosos (degree dissertation in medicine). Porto, Escola Médico-Cirúrgica do Porto, 1903.
CORREIA, António Mendes. O Génio e o Talento na Patologia. Porto, Imprensa Portuguesa, 1911.
_______. “Instrução e Criminalidade em Portugal” In offprint of Porto Médico, 1912a, vol. 1, pp. 1–7.
_______. “A Situação dos Médicos Legistas e os Progressos da Antropologia Criminal” In Porto Médico, vol. 2, pp. 46–53, 1912b.
_______. Os Criminosos Portugueses: Estudos de Antropologia Criminal. Porto, Imprensa Portuguesa, 1st ed. 1913. Coimbra, França Amado, 2nd ed. 1914.
_______. “Um Delinquente Habitual: Exame Médico Antropológico” In offprint of Gazeta dos Hospitais do Porto, 1913b, vol. 9, pp. 1–14.
_______. “A Criminalidade Precoce” In A Tutoria, 1913c, vol. 11, pp. 179–81.
_______. Crianças Delinquentes: Subsídios para o Estudo da Criminalidade em Portugal. Coimbra, Typ. França Amado, 1915a.
_______. Antropologia: Resumo das Lições Feitas pelo Assistente, Servindo de Professor da Cadeira. Porto, Imprensa Portuguesa, 1915b.
_______. Raça e Nacionalidade. Porto, Renascença Portuguesa, 1919.
_______. “Antropologia Criminal Integral: O Normal Delinquente e a Crise Moral” In offprint of Boletim do Instituto de Criminologia, 1925, vol. 5, pp. 1–25.
_______. “Le Normal Délinquant et la Crise Morale”, Revue Anthropologique, 1926, vols 7–9, pp. 1–22.
_______. A Nova Antropologia Criminal. Porto, Imprensa Portuguesa, 1931a.
_______. “Inquérito sobre as Ideias Morais em Criminosos e Não Criminosos” In offprint of Arquivo da Repartição de Antropologia Criminal, Psicologia Experimental e Identificação Civil do Porto, 1931b, vol. 1, no. 2, pp. 101–5.
_______. “O Prof. Carrara e ‘A Nova Antropologia Criminal’” In offprint of Arquivo da Repartição de Antropologia Criminal, Psicologia Experimental e Identificação Civil do Porto, 1931c, vol. 1, no. 3, pp. 181–90.
_______. “Ideias Morais em Jovens Criminosos e Não Criminosos” In Asociación Española para el Progreso de las Ciencias. Madrid, Huelves y Compañia, 1932a, pp. 55–8.
_______. “La Nouvelle Anthropologie Criminelle” In offprint of Scientia: Revue Internationale de Synthèse Scientifique, 1932b, vol. 51, pp. 357–65.
_______. “L’Étude du Criminel en Portugal” In offprint of Revue de Droit Pénal et de Criminologie, 1932c, vol. 2, pp. 1–28.
_______. Introdução à Antropobiologia. Coimbra, Imprensa da Universidade, 1933.
_______. “La Nuova Antropologia Criminale” In offprint of Giustizia penale, 1936a, vol. 1, pp. 1–35.
_______. “La Nuova e la Vecchia Antropologia Criminale” In offprint of Giustizia penale, 1936b, vol. 7, pp. 1–50.
_______. “A Nova e a Velha Antropologia Criminal” In offprint of Arquivos de Medicina Legal e Identificação. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1937, vol. 13, pp. 1–30.
_______. “Les ‘Profils’ en Anthropologie, Biotypologie et Criminologie”, Bolletino del Comitato Internazionale per L’Unificazione dei Metodi e per la Sintesi in Antropologia Eugenica e Biologia, 1939, vol. 9, pp. 1–6.
_______. A Escola Antropológica Portuense. Lisbon, Bertrand, 1941, pp. 1–61.
_______. Em Face de Deus: Memórias e Confissões. Porto, Fernando Machado, 1946.
ESTATUTOS DA SOCIEDADE PORTUGUESA DE ANTROPOLOGIA E ETNOLOGIA, Porto, SPAE, 1918.
FERREIRA, António Aurélio da Costa. La capacité crânienne chez les criminels portugais, Bulletins et Mémoires de la Société d’Anthropologie de Paris, 1905, vol. 6, pp. 357–361.
FONSECA, Sérgio Moreira da. O crime: Considerações gerais (degree dissertation in medicine). Porto, Escola Médico-Cirúrgica do Porto, 1902.
FRIAS, Roberto. O Crime: Apontamentos para a sua sistematização (Degree dissertation in medicine). Porto, Escola Médico-Cirúrgica do Porto, 1880.
LOMBROSO, Cesare. L’uomo delinquent. Milano, Hoepli, 1876.
MACEDO, Francisco Ferraz de. Crime et criminel: essai synthétique d'observations anatomiques, physiologiques, pathologiques et psychiques sur des délinquants vivnats et morts selon la méthode et les procédés anthropologiques les plus rigoureux. Paris, Belhate & Thomas, 1892.
_______. Bosquejos de Antropologia Criminal. Lisbon, Imprensa Nacional, 1900.
_______. Os criminosos “evadidos do Limoeiro em 1847”. Lisbon, Tipografia da Papelaria Palhares, 1901.
NORDAU, Max Simon, Entartung, 2 vols, Berlin, Carl Duncker, 1892-1893.
OLIVEIRA, Manuel José de. O problema de Lombroso: Estudo crítico de bio-sociologia sobre a teoria atávica do crime (Degree dissertation in medicine). Porto, Escola Médico-Cirúrgica do Porto, 1904.
PEIXOTO, António Augusto da Rocha. “A tatuagem em Portugal”, In Revista de Sciencias Naturaes e Sociaes. Porto, Typographia Occidental, 1893, vol. II, pp. 97–111, 145.
PEREIRA, João António. As prisões (Degree dissertation in medicine). Porto, Escola Médico-Cirúrgica do Porto, 1881.
PÉRY, Gérard. Geografia e Estatística Geral de Portugal e Colónias. Lisbon, Imprensa Nacional, 1875.
PESSOA, Alberto. “História da introdução em Portugal dos métodos científicos de Identificação Criminal” In Congressos do Mundo Português: Congresso da História da Actividade Científica Portuguesa, Ciências Físico-Matemáticas e Militares, Ciências Naturais e Biológicas, 1940, vol. 12, Lisbon, Comissão Executiva dos Centenários, pp. 709–722.
VASCONCELOS, José Leite de. “A Antropologia portuguesa como fonte de investigação etnográfica” In Boletim de Etnografia, 1928, vol. 4, pp. 1–19.
Secondary sources
AMELUNG, Nina. “‘Crisis’, control and circulation: Biometric surveillance in the policing of the ‘crimmigrant other’” In International Journal of Police Science & Management, 2023, vol. 25, no. 3, pp. 297–312.
BASHFORD, Alison; LEVINE, Philippa (eds). The Oxford Handbook of the History of Eugenics. Oxford, Oxford University Press, 2010.
BASTOS, Susana Pereira. O Estado Novo e os Seus Vadios: Contribuição para o Estudo das Identidades Marginais e da sua Repressão. Lisbon, Dom Quixote, 1997.
BORGES, Viviane. “O arquivo e a prisão: a premissa de inferioridade dos indivíduos incômodos (Brasil, 1930 – ao tempo presente)” In Revista Brasileira de História, 2023, vol. 43, no. 94, pp. 123–144.
CLEMINSON, Richard. Catholicism, Race and Empire: Eugenics in Portugal (1900-1950). Budapest & New York, Central European University Press.
CORRÊA, Mariza. As Ilusões da Liberdade: A Escola Nina Rodrigues e a Antropologia no Brasil, 3rd ed. Rio de Janeiro, Fiocruz, 2013 (1998).
FATELA, João. O Sangue e a Rua: Elementos para uma Antropologia da Violência em Portugal (1926-1946). Lisbon, Dom Quixote, 1989.
FOUCAULT, Michel. Surveiller et Punir: Naissance de la Prison. Paris, Gallimard, 1975.
GOFFMAN, Erving. Stigma: Notes on the Management of Spoiled Identity. New York, Simon and Schuster, 1963.
GOULD, Stephen Jay. The Mismeasure of Man. New York, Norton & Company, 1981.
KÜHL, Stefan. For the Betterment of the Race: The Rise and Fall of the International Movement for Eugenics and Racial Hygiene. New York, Palgrave Macmillan, 2013 (1997).
LEVINE, Philippa. “Anthropology, Colonialism, and Eugenics” In BASHFORD, Alison; LEVINE, Philippa (eds), The Oxford Handbook of the History of Eugenics. Oxford, Oxford University Press, pp. 43–61.
LOPES, João Teixeira (ed.). A Tutoria do Porto: Estudo sobre a Morte Social Temporária. Porto, Afrontamento, 2001.
MADUREIRA, Nuno Luís. “A Estatística do Corpo: Antropologia Física e Antropometria na Alvorada do Século XX” In Etnográfica, 2003, vol. 7, no. 2, pp. 283–303.
MATOS, Patrícia Ferraz de. “Aperfeiçoar a ‘raça’, salvar a nação: Eugenia, teorias nacionalistas e situação colonial em Portugal” In Trabalhos de Antropologia e Etnologia, 2010, vol. 50, pp. 89–111.
_______. “Um olhar sobre as relações entre Portugal e o Brasil a partir da obra de Mendes Correia: desafios, pontes e interacções” In População e Sociedade, 2013, vol. 21, pp. 53–69.
MATOS, Patrícia Ferraz de; BIRKALAN-GEDIK, Hande; BARRERA-GONZÁLEZ, Andrés; VAIL, Pegi (eds) In World Fairs. Special Issue of Anthropological Journal of European Cultures, 2022, vol. 31, no. 2, pp. 1–132.
MATOS, Patrícia Ferraz de. Anthropology, Nationalism and Colonialism: Mendes Correia and the Porto School of Anthropology. Oxford & New York, Berghahn Books, 2023.
QUINTAIS, Luís. Mestres da Verdade Invisível: No Arquivo da Psiquiatria Forense Portuguesa. Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2012.
SANSONE, Livio. La Galassia Lombroso. Roma, Editori Laterza, 2022.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. O Espectáculo das Raças: Cientistas, Instituições e Questão Racial no Brasil: 1870-1930. São Paulo, Companhia das Letras, 2007 [1993].
SOUZA, Vanderlei Sebastião de. Renato Kehl e a Eugenia no Brasil: Ciência, Raça e Nação no Período Entreguerras. Guarapuava, Editora Unicentro, 2019.
STEPAN, Nancy Leys. The Idea of Race in Science: Great Britain 1800-1960. London, MacMillan Press, 1982.
STOCKING, George W. Jr. Race, Culture and Evolution: Essays in the History of Anthropology. Chicago, University of Chicago Press, 1968.
_______. (ed.). Bones, Bodies, Behaviour: Essays on Biological Anthropology, vol. 5. London, University of Wisconsin Press, 1988.
TURDA, Marius; GILLETTE, Aaron. Latin Eugenics in Comparative Perspective. London & New York, Bloomsbury.
WEBER, Maria Julieta; MATOS, Patrícia Ferraz de. “Melhorar a espécie humana desde a infância: Eugenia e higiene mental no Brasil e em Portugal (primeira metade do século XX)” In Zero-a-Seis, 2023, vol. 25, no. 47, pp. 16–40.
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
Copyright (c) 2024 Revista de História Regional
Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution 4.0 International License.
Autores que publicam nesta revista concordam com os seguintes termos:
a) Os autores mantêm os direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação, com o trabalho simultaneamente licenciado sob a Creative Commons Attribution License que permite o compartilhamento do trabalho com reconhecimento da sua autoria e publicação inicial nesta revista.
b) Os autores são autorizados a assinarem contratos adicionais, separadamente, para distribuição não exclusiva da versão publicada nesta revista (por exemplo, em repositórios institucionais ou capítulos de livros), com reconhecimento da sua autoria e publicação inicial nesta revista).
c) Os autores são estimulados a publicar e distribuir a versão onlline do artigo (por exemplo, em repositórios institucionais ou em sua página pessoal), considerando que isso pode gerar alterações produtivas, bem como aumentar o impacto e as citações do artigo publicado.
d) Esta revista proporciona acesso público a todo o seu conteúdo, uma vez que isso permite uma maior visibilidade e alcance dos artigos e resenhas publicados. Para maiores informações sobre esta abordagem, visite Public Knowledge Project, projeto que desenvolveu este sistema para melhorar a qualidade acadêmica e pública da pesquisa, distribuindo o OJS assim como outros softwares de apoio ao sistema de publicação de acesso público a fontes acadêmicas.
e) Os nomes e endereços de e-mail neste site serão usados exclusivamente para os propósitos da revista, não estando disponíveis para outros fins.
Este obra está licenciado com uma Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional.
Este obra está bajo una licencia de Creative Commons Reconocimiento 4.0 Internacional.