"A ditadura pegava era só quem era vagabundo mesmo": frutos do golpe de 1964 sobre camponeses norte-mineiros
DOI:
https://doi.org/10.5212/Rev.Hist.Reg.v.30.23850Palavras-chave:
Cachoerinha, Comissão da Verdade, Coronel Georgino, Saluzinho, VarzelândiaResumo
A afirmação que a ditadura militar brasileira só pegava quem era vagabundo é uma ideia que se ouve por parte de algumas pessoas no Brasil. A partir dessa ideia provocativa, e considerando fontes como jornais, entrevistas, artigos e livros, este artigo busca mostrar como um modelo desenvolvimentista, assentado a partir do golpe militar de 1964, intensificou violências contra camponeses no Norte de Minas Gerais. A partir de um olhar para essa região do país, é possível ter conhecimento de que violências e repressões ocorreram contra pessoas do campo e seus apoiadores. Ali, emergiu um coronel, chamado Georgino Jorge de Souza, que encarnou em si intentos do golpe e ditadura militar a partir de 1964. Em e a partir da cidade de Montes Claros, um esquema foi montado, com transações e trocas de serviços beneficiando alguns indivíduos, os quais se aproveitaram de ímpetos do espírito que vinha sendo instaurado na região. Grandes fazendeiros, tendo a cidade montesclarense como centro de atuação, buscaram ampliar seu poderio e expandir territórios. O referido coronel, simbolizado por seu 10º Batalhão de Polícia Militar, age despejando posseiros de lugares onde viviam. Para amparar modos de ação assim, uso foi feito de discursos, narrativas e violências, classificando camponeses como comunistas, obstáculos para intenções de grupos sociais que buscavam ampliar suas propriedades territoriais e, com isso, colherem benefícios do governo. Os resultados deste estudo demonstram que, durante a ditadura militar, sob as consequências do discurso militar a favor do avanço econômico, grandes fazendeiros perpetraram violências contra camponeses e seus defensores a fim de terem mais terras e, consequentemente, dinheiro.
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