ALTERNATIVAS PARA A DIMINUIÇÃO DO MAL-ESTAR DOCENTE: REVISÃO SISTEMÁTICA DAS TESES E DISSERTAÇÕES NO PERÍODO DE 2000 A 2016
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ALTERNATIVAS PARA A DIMINUIÇÃO DO MAL-ESTAR DOCENTE: REVISÃO SISTEMÁTICA DAS TESES E DISSERTAÇÕES NO PERÍODO DE 2000 A 2016
ALTERNATIVES TO REDUCE TEACHERS’ MALAISE: A SYSTEMATIC REVIEW OF THESIS AND DISSERTATIONS FROM 2000 TO 2016
ALTERNATIVAS PARA LA DISMINUCIÓN DEL MALESTAR DOCENTE: REVISIÓN SISTEMÁTICA DE LAS TESIS Y DISERTACIONES EN EL PERÍODO DE 2000 A 2016
ALTERNATIVAS PARA A DIMINUIÇÃO DO MAL-ESTAR DOCENTE: REVISÃO SISTEMÁTICA DAS TESES E DISSERTAÇÕES NO PERÍODO DE 2000 A 2016
Olhar de Professor, vol. 20, núm. 1, 2017
Universidade Estadual de Ponta Grossa
Recepção: 03 Março 2017
Aprovação: 03 Junho 2017
Resumo: Este texto analisa dados de teses e dissertações que se encontram publicadas no Banco de Dados de Teses e Dissertações (BDTD) no período de 2000 a 2016. O estudo tem por objetivo verificar quais são as alternativas de diminuição do mal-estar utilizadas pelos professores, para tal utilizou-se da técnica de pesquisa denominada como “estado do conhecimento”. Ao todo 51 trabalhos foram analisados, sendo 8 teses e 43 dissertações. Para chegarmos a esse total nos valemos do descritor “mal-estar docente” e da leitura dos s, introduções e conclusões dos documentos. Os resultados apontam que diversos são os meios utilizados para se chegar ao bem-estar e estes dividem-se em alta e baixa frequência. No que se refere aos fatores de alta frequência, os mais emergentes foram: a relação profissional harmoniosa e cooperativa, a relação afetiva com os alunos e a formação continuada. No que tange àqueles que apareceram com baixa frequência encontram-se a motivação, a importância social do trabalho e o gerenciamento do trabalho e da vida pessoal. Para uma melhor análise desses fatores optamos por organizá-los em duas dimensões: objetiva e subjetiva. No âmbito da dimensão objetiva destaca-se o componente relacional, que apresentou o maior número de frequências. Por sua vez, no que se refere à dimensão subjetiva encontram-se a vocação e a auto-realização. Observou-se que apesar de o “mal-estar docente” ocupar regularidade entre as análises dos pesquisadores da educação, as alternativas para a diminuição dos mesmos não costumam ser abordadas com a mesma regularidade com que são tratadas as causas para o mal-estar.
Palavras-chave: Mal-estar docente, Alternativas para a diminuição do mal-estar docente, Trabalho docente.
Abstract: This article analyzes data from theses and dissertations that have been published in the Database of Theses and Dissertations (BDTD) from 2000 to 2016. The study aims to verify what the alternatives used by teachers to minimize teacher’s malaise are, to do so the research technique known as the "state of knowledge" was used. In total 51 papers were analyzed, being 8 theses and 43 dissertations. To reach this amount we took into account the descriptor "teacher malaise" and the reading of summaries, introductions and conclusions of the documents. The results indicate that several are the means used to achieve well-being and these are divided into high and low frequency. With regard to the high frequency factors, the most emergent ones were: the harmonious and cooperative professional relationship, the affective relation with the students and the continuing education. As for those who have appeared at a low frequency, motivation, the social importance of work and the management of work and personal life are some of the emerged aspects. For a better analysis of these factors we have chosen to organize them in two dimensions: objective and subjective. Within the extend of the objective dimension, the relational component is highlighted, which presented the highest number of frequencies. In its turn, when it comes to the subjective dimension, vocation and self-realization are the elements that showed up. It was observed that although "teacher malaise" is a recurrent topic among the analyzes of the education researchers, the alternatives for its reduction are not usually approached with the same frequency as its causes.
Keywords: Teacher malaise, Alternatives for the reduction of teacher malaise, Teacher’s work.
Resumen: Este texto analiza datos de tesis y disertaciones que se encuentran publicadas en el Banco de Datos de Tesis y Disertaciones (BDTD) en el período de 2000 a 2016. El estudio tiene por objetivo verificar cuáles son las alternativas de disminución del malestar docente utilizadas por los profesores, para eso se utilizó la técnica de investigación denominada "estado del conocimiento". En total 51 trabajos fueron analizados, los que consisten en 8 tesis y 43 disertaciones. Para llegar a esta cantidad, nos valemos del descriptor denominado "malestar docente" y de la lectura de los resúmenes, introducciones y conclusiones de los documentos. Los resultados muestran que los medios utilizados para lograr el bienestar son diversos, y éstos se dividen en alta y baja frecuencia. En lo que se refiere a los factores de alta frecuencia, los más emergentes fueron: la relación profesional armoniosa y cooperativa, la relación afectiva con los alumnos y la formación continuada. En lo que se refiere a aquellos que aparecieron con baja frecuencia se encuentran la motivación, la importancia social del trabajo y la gestión del trabajo y de la vida personal. Para un mejor análisis de estos factores optamos por organizarlos en dos dimensiones: objetiva y subjetiva. En el ámbito de la dimensión objetiva se destaca la componente relacional, que presentó el mayor número de frecuencias. Por su parte, en lo que se refiere a la dimensión subjetiva se encuentran la vocación y la auto-realización. Se observó que a pesar de que el "malestar docente" ocupar regularidad entre los análisis de los investigadores de la educación, las alternativas para la disminución de este no son abordadas con la misma regularidad con la que se tratan las causas para el malestar.
Palabras clave: Malestar docente, Alternativas para la disminución del malestar docente, Trabajo docente.
Introdução
Este estudo vincula-se a etapa de levantamento bibliográfico e revisão sistemática de literatura da pesquisa em andamento, desenvolvida em nível de mestrado, no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, na Faculdade de Ciências e Tecnologia campus de Presidente Prudente, intitulada “Mal-estar e trabalho docente na escola de tempo integral”. O objetivo foi mapear as produções acadêmico-científicas referente a temática do mal-estar docente de professores que atuam na educação básica brasileira, tomando como base dissertações e teses publicadas no Banco de dados de Teses e Dissertações (BDTD) no período de 2000 a 2016. Essa base de dados foi selecionada, pois apresenta pesquisas convalidadas e analisadas por banca.
Breve revisão teórica
A questão do mal-estar docente tem sido pesquisada há alguns anos. Durante as décadas de 1980 e 1990, pesquisas na área educacional demostravam que as problemáticas e os obstáculos da Educação tinham como foco principal os discentes, já que o processo educativo era centrado nos mesmos. Entretanto, era necessário levar em consideração o profissional docente e aprofundar-se nas questões referentes a ele. Assim, iniciaram-se pesquisas sobre o exercício da docência e começaram a surgir, especialmente na Europa, discussões sobre as diversas dificuldades encontradas pelos professores, uma vez que a profissão docente já não era mais tão atraente. Desse modo, a figura do professor e suas práticas pedagógicas começaram a receber uma maior atenção dos pesquisadores (RINALDI, 2016; CUNHA, 2013; DINIZ-PEREIRA, 2013; ANDRÉ, 2010). Debates sobre a insatisfação dos professores e suas condições de trabalho, carga horária e salário eram cada vez mais comuns. Contudo, foi somente a partir da década de 1990 que os debates ganharam mais força, e fatores que teriam contribuído para a propagação do desencanto em ser professor ficaram mais evidentes.
Para Mancebo (2007) os estudos apontam inúmeros fatores que contribuem para o agravamento do desencanto ou desistência da profissão docente, entre os quais: fatores que como a precarização do trabalho docente (baixa remuneração; desqualificação e fragmentação do trabalho do professor; perda real e simbólica de espaços de reconhecimento social; heteronomia crescente e controle do professor em relação ao seu trabalho); intensificação do regime de trabalho (mudanças ocorridas na jornada de trabalho; aumento do sofrimento subjetivo etc.); flexibilização do trabalho (implementação de contratos de trabalho mais ‘ágeis’ e ‘econômicos’; novas atribuições agendadas para os professores etc.); descentralização gerencial e a ‘ilusão da participação’; sistemas avaliativos (avaliações gerenciais, indicadores de produtividade etc.).
As pesquisas no campo da formação de professores têm se aproximado nos últimos tempos das discussões sobre o trabalho docente. Reconhecer o espaço de trabalho como lugar de formação redundou em uma tendência significativa de pesquisar o docente em seu contexto de atuação, em que ele é reconhecido como produtor de saberes e, ao mesmo tempo, responde, enquanto produzido, às condições objetivas de existência e profissionalização.
Apesar das inúmeras pesquisas existentes sobre o tema do mal-estar docente, ainda existe uma lacuna no que se refere às alternativas para a diminuição desse problema, como ressaltam Rebolo e Bueno (2014, p. 323): “A felicidade e a satisfação no trabalho encontram-se entre os temas raramente analisados por aqueles que se dedicam ao estudo da vida e do trabalho dos professores”. Ainda, segundo as autoras, a compreensão das fontes e dinâmicas que auxiliam no bem-estar docente é relevante, pois através das mesmas os professores podem familiarizar-se com caminhos e estratégias para superar os conflitos e dificuldades no trabalho, almejando possibilidades de reestruturação de suas práticas e modos de ser e estar na profissão.
Dessa forma, tendo em vista o expressivo número de pesquisas sobre o mal-estar entre os professores, mas por outro lado um número reduzido sobre a temática de alternativas para a diminuição do mesmo, consideramos necessário o levantamento de estudos que abordam essa temática, a fim de compreender melhor o que as teses e dissertações brasileiras revelam sobre o tema na contemporaneidade.
Metodologia
As pesquisas do tipo Estado da Arte ou Estado do Conhecimento apresentam caráter bibliográfico, têm por objetivo mapear e sistematizar as formas e condições de produção de conhecimentos de determinado campo ou área do saber por meio de diversos veículos de comunicação, a saber: teses de doutorado, dissertações de mestrado, publicações de artigos em anais de eventos e de periódicos científicos. Nessa perspectiva, o presente estudo enquadra-se como Estado do Conhecimento, uma vez que realizamos uma pesquisa bibliográfica com a finalidade de mapear/discutir certa produção acadêmica de certo período e sobre um tema, com o objetivo de responder quais os aspectos e dimensões vêm sendo destacados em diferentes épocas e lugares, de que formas e em que condições têm sido produzidas as dissertações, teses, publicações em periódicos e comunicações em anais de congressos e seminários (FERREIRA, 2002).
A partir da análise dos títulos, palavras-chave das teses e dissertações do BDTD foram selecionadas apenas os estudos que tratassem do tema mal-estar docente na educação básica. Quando utilizamos os descritores “mal-estar docente” e “educação básica” apenas 11 trabalhos foram encontrados, ou seja, um número reduzido se considerarmos o número de pesquisas concluídas sobre a temática. Assim, refizemos a busca e utilizamos apenas o descritor “mal-estar docente” e encontramos um total de 102 trabalhos. Como nosso intuito era selecionar apenas os trabalhos com professores da educação básica, foi necessário realizar uma leitura dos resumos para seleção daqueles que comporiam o corpus a ser analisado, devido à falta de clareza do tema nos títulos e nas palavras-chave em alguns estudos. Foram selecionados ao final 51 estudos no período compreendido entre 2000 a 2016, sendo 8 teses e 43 dissertações.
Após a seleção, iniciou-se uma nova etapa de análise do material selecionado, em que foi realizada novamente a leitura dos resumos, entretanto, dessa vez expandimos a leitura para a seção de introdução e conclusão dos textos para que pudéssemos compreender o que as teses e dissertações apontam sobre a superação do mal-estar docente nos professores que atuam na educação básica.
Resultados e discussão
Na análise do material sistematizado, foi possível perceber que diversos são os fatores que contribuem para a diminuição do mal-estar docente e eles aparecem em alta e baixa frequência (tabela 1).
No que se refere aos fatores de alta frequência que auxiliam na minimização do mal-estar destacam-se a relação profissional harmoniosa e cooperativa, a relação afetiva com os alunos e a formação continuada, como se pode observar no Gráfico 1.
Gráfico 1
No que tange aos elementos que contribuem para a diminuição do mal-estar docente e que apareceram com frequência baixa, podemos destacar a motivação, a importância social do trabalho e o gerenciamento do trabalho e da vida pessoal (Gráfico 2).
Gráfico 2
Os fatores de alta e baixa frequência podem ser divididos em duas dimensões: objetiva e subjetiva (CSIKSZENTMIHALYI, 1992 apud REBOLO; BUENO, 2014).
A dimensão objetiva representa as características do trabalho e as condições em que ele é realizado. Ela pode ser agrupada em quatro componentes: componente da atividade laboral, componente relacional, componente socioeconômico e componente infraestrutural.
No componente da atividade laboral destacam-se as funções que o trabalho docente comporta e suas características quanto à pluralidade e identidade que possuem entre si, o nível de autonomia na realização do trabalho, os desafios impostos, as habilidades e dedicação exigidas, as metas a serem atingidas e o retorno oferecido. O componente relacional caracteriza-se pela convivência com os outros professores, funcionários e alunos, abrangendo os fatores de liberdade de expressão, discussão e aceitação de sugestões, trabalho em grupo e troca de experiência, tratamento igualitário, participar e ter conhecimento das decisões sobre metas e objetivos, suporte socioemocional e ser reconhecido pelo trabalho realizado. No que tange ao componente socioeconômico sublinha-se o direito ao salário fixo e salário variável (bônus, gratificações, hora extra etc.), auxílios materiais e não materiais, garantia de direitos, emprego estável, plano de carreira, tempo para a família e para lazer, carga horária não sobrecarregada, imagem interna e externa da escola e do sistema educacional, responsabilidade comunitária e social da escola, aperfeiçoamento e desenvolvimento profissional e grau de interesse dos alunos. O último componente é o infraestrutural, que abrange as condições dignas de trabalho, tanto material quanto ambiental, incluindo infraestrutura, instalações, limpeza, segurança, equipamentos e materiais disponíveis para a prática do trabalho.
A dimensão subjetiva por sua vez, está relacionada aos aspectos pessoais (competências, habilidades, necessidades, desejos, valores, crenças, formação e projeto de vida) e envolve também elementos considerados fundamentais para o bem-estar: a autoaceitação, a convivência saudável com outras pessoas, a autonomia, o domínio do ambiente, o propósito de vida e o crescimento pessoal.
Como é possível observar no Gráfico 1, seis fatores de alta frequência foram encontrados: relação profissional harmoniosa e cooperativa, relação afetiva com os alunos, formação continuada, valorização profissional, amor pela profissão e resiliência. Quatro desses fatores são de dimensão subjetiva (formação continuada, valorização profissional, amor pela profissão e resiliência) e dois encontram-se no âmbito da dimensão objetiva (relação profissional harmoniosa e cooperativa e relação afetiva com os alunos).
O componente relacional também obteve espaço nos resultados encontrados na pesquisa de Rebolo e Bueno (2014), onde para os professores do estudo, as fontes de bem-estar estão relacionadas principalmente aos fatores do componente relacional do trabalho e da atividade laboral. As autoras destacam que:
O componente relacional é constituído pelas relações interpessoais e pelas dinâmicas relacionais estabelecidas no ambiente escolar. O relacionamento com diretores, com os demais professores, alunos e funcionários, quando positivo, oferece apoio social, emocional e técnico; possibilita a consecução de metas que não poderiam ser realizadas individualmente, atende as necessidades de amizade e reduz sentimentos de solidão e frustração, oferece retorno sobre o trabalho realizado, informa e esclarece sobre as expectativas normativas do papel do professor e propicia o sentimento de aceitação e pertencimento ao grupo. (REBOLO; BUENO, 2014, p. 327).
Os fatores de componente relacional foram abordados com a mesma frequência que a “formação continuada”, ainda que esta, por sua vez, se encontra na dimensão subjetiva. Jesus (2002) descreve sobre a importância da formação continuada para o desenvolvimento e a realização profissional do professor. De acordo com o autor, a formação continuada oferecerá bons resultados se for concebida em uma perspectiva relacional, onde o trabalho em equipe é priorizado e voltado para a discussão dos problemas da rotina profissional. A formação continuada possui um caráter resolutivo dos problemas profissionais, enquanto a formação inicial um caráter preventivo. Considerando esse aspecto, nos chama a atenção o fato do investimento da formação inicial encontrar-se nos fatores de baixa frequência, uma vez que como afirma Esteve (1992 apud JESUS, 2002, p. 36): “[...] a formação contínua tem menos importância do que a prevenção durante o processo de formação inicial, pois desde que o professor em início de carreira supere o “choque com a realidade”, as tensões iniciais diminuem, possibilitando-lhe a sua auto-realização profissional.”
Ainda no que tange aos fatores de alta frequência, temos outros dois fatores de dimensão subjetiva, o amor pela profissão e a valorização profissional, sendo estes igualmente citados. A temática do amor pela profissão é abordada por Jesus (2002, p. 47), o autor destaca que “[...] é também importante que o professor goste de ensinar e de se relacionar com os alunos para que se consiga realizar na sua atividade profissional.” A questão da desvalorização foi discutida por Lima (1996), quando concluiu que a educação tornou-se um tema em que todos os grupos sociais se veem no direito de opinar, resultando como destaca Bourdieu (1978, apud LIMA, 1996), no desprestígio dos títulos dos profissionais da educação. Essa vulgarização dos assuntos educacionais influencia diretamente no trabalho do professor, uma vez que o mesmo se sente sem autoridade para tomar decisões que julgam corretas. Assim, os professores que se sentem valorizados e reconhecidos possuem menos propensão ao mal-estar.
Ainda, nos fatores de alta frequência, alguns estudos defendem a resiliência (dimensão subjetiva) como alternativa para a diminuição do mal-estar e recomendam a adaptação aos contextos em que estão inseridos para que assim possam vir a atingir o bem-estar. Além disso, afirmam que os professores são os responsáveis pelo sentimento de bem-estar no trabalho:
[...] existem professores que não se deixam abater e influenciar por tais crises e vêm desempenhando práticas bem-sucedidas sendo reconhecidos pela instituição na qual trabalham e, principalmente, por seus alunos. Devido a essa concepção, o presente estudo foi pensado para que se possa analisar o que diferencia alguns professores que encaram a docência de forma positiva e com grande satisfação. Sua forma de encarar tudo o que envolve a docência faz com que se diferenciem dos demais, refletindo em suas salas de aula e qualificando sua relação com os alunos. (FELIX, 2009, p. 6).
Como é possível perceber no excerto acima a responsabilidade do mal-estar e do bem-estar é transferida para o professor, uma vez que a forma do mesmo “encarar” à docência resultará em um sentimento bom ou ruim sobre o ambiente de trabalho e isso influenciará positivamente ou negativamente o docente. Entretanto, manter controle psicológico não é algo simples, as condições precárias de trabalho, a violência, a desvalorização profissional e outros aspectos que foram citados anteriormente afetam o professor e é difícil o mesmo não se abalar por esses fatores. Dessa maneira, a questão do bem-estar/ mal-estar não pode ser incumbida totalmente como responsabilidade dos professores. A passividade e a vitimização do professor também foram abordadas no estudo de Santos (2013, p. 7):
Os resultados da pesquisa apontam o estado de passividade e desesperança de alguns professores diante dessas questões. Tendo analisado as razões do mal-estar, a pesquisa conclui que uma superação desse estado de passividade exige a desvinculação do discurso que coloca o docente como refém e vítima desses dilemas. O estudo aponta, para esses professores, a necessidade do exercício de sua vontade de potência, força humana afirmativa.
Apesar de Santos (2013, p. 7) ressaltar que os fatores associados ao mal-estar como “[...] às falhas do processo educacional enquanto operador de interdição dos alunos; a degenerescência e depreciação de alguns valores no campo educacional [...]”, a mesma transferiu a solução do mal-estar para os docentes ao dizer que é necessário que os mesmos superem o estado de passividade, o que remete a ideia de que os mesmos devem “lutar” para que possam atingir um estado de bem-estar. Em nossa concepção, não é papel do professor apenas empenhar-se para obter o bem-estar, e sim das políticas educacionais, como destaca Maslach (1999, apud JESUS, 2002, p. 46), “[...] os professores são o que há de mais valioso no sistema educativo, pelo que promover o seu bem-estar deveria ser o principal objetivo em política educativa.”
Em relação às alternativas que comparecem com baixa frequência, observáveis no Gráfico 2, também é possível dividi-los em dimensão subjetiva e objetiva. Na dimensão objetiva, encontram-se, por exemplo, as condições adequadas de trabalho (componente infraestrutural), a autonomia (componente da atividade laboral) e o gerenciamento do tempo entre o trabalho e a vida pessoal (componente socioeconômico). Por sua vez, na dimensão subjetiva comparecem a vocação e a auto-realização.
Os fatores de baixa frequência que se destacaram foram a motivação e a importância social do trabalho, ambos aspectos relacionam-se com a dimensão subjetiva. No que tange a motivação, Jesus (2000) enfatiza que:
[..] as expectativas de eficácia estão na base da motivação intrínseca do professor, uma vez que esta motivação está directamente ligada à percepção de competência pessoal. A motivação intrínseca do professor tem também a sua raíz na autodeterminação ou orientação motivacional para a actividade docente, sendo a motivação intrínseca tanto maior, quanto maior o desejo pessoal de continuar na profissão docente. (JESUS, 2000, p. 218).
Assim, é possível perceber a importância dos elementos e incentivos intrínsecos em relação aos extrínsecos. Nessa perspectiva, concordamos que a motivação é relevante para a qualidade do desempenho docente e que a mesma auxilia na atuação em momentos desafiadores e na construção de estratégias. Entretanto, ela não é um fator determinante para a diminuição do mal-estar, uma vez que os fatores externos impactam diretamente o professor. Um fator que está diretamente ligado a motivação do professor é a importância social do trabalho. Branquinho (2010, p. 119) observou em um dos núcleos temáticos de sua pesquisa, denominado “senso de utilidade do trabalho” que a relevância social do trabalho docente atuava como uma fonte de bem-estar, especialmente entre os que trabalhavam na APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais.
Algumas temáticas manifestaram-se apenas uma vez, como o parâmetro profissional menos idealístico e o reconhecimento das próprias limitações, sendo que essas também fazem parte da dimensão subjetiva. Entretanto, muitos desses fatores ímpares podem ser considerados inovadores, dentre eles a atividade artística, as atividades lúdico-corporais e a feminilidade.
Ao desenvolver seu estudo, Gerber (2007) concluiu que a atividade artística possibilitou às professoras participantes de sua pesquisa uma sensação de bem-estar e as mesmas ao perceberem os benefícios passaram a fazer uso desta prática diminuindo os efeitos do estresse relacionado ao trabalho. A questão da feminilidade foi abordada por Ferraz (2013, p. 05) e de acordo com a mesma “[...] é no contato com a feminilidade que a mulher professora poderá abrir mão da maternidade para se lançar no vazio da sua incompletude e lançar mão de subterfúgios para inovar a sua prática, a sua docência [...]”. A autora vê a feminilidade como um escape para que as mulheres professoras possam minimizar o mal-estar que faz parte de seu cotidiano.
Por fim, Ressurreição (2005) ao analisar as atividades lúdico-corporais vivenciadas na formação docente concluiu que tal atividade viabiliza o contato integral com o self. Como resultado, percebeu que “[...] ao atuarem nos movimentos e sentimentos, as atividades proporcionam maior consciência corporal que, por sua vez, leva o sujeito a escutar a si mesmo e ter maior disponibilidade para as interações.” (RESSURREIÇÃO, 2015, p. 302). Assim, tanto a auto-estima, quanto a estimulação à convivência auxiliam no reencantamento com o trabalho e no engajamento e equilíbrio de energias.
Considerações Finais
A partir dos resultados da pesquisa identificou-se que muitos trabalhos versam sobre a temática do mal-estar docente, entretanto há um predomínio da abordagem das causas do mal-estar em relação às alternativas para a diminuição do mesmo. Diferentes fatores para a diminuição do mal-estar docente foram encontrados, mas em números relativamente reduzidos. Foi possível dividir as alternativas que contribuem para a minimização do mal-estar em frequência alta e baixa. Podemos destacar a questão a relação profissional harmoniosa e cooperativa, a relação afetiva com os alunos e a formação continuada em meio aos fatores de alta frequência. Entre as alternativas de frequência baixa encontram-se a motivação, a importância social do trabalho e o gerenciamento do trabalho e da vida pessoal. Este gráfico apresentou uma grande diversidade, 28 alternativas para a diminuição do mal-estar foram localizadas. As alternativas também foram divididas em duas dimensões: objetiva e subjetiva. No âmbito da dimensão objetiva destaca-se o componente relacional, que apresentou o maior número de frequências. Por sua vez, no que se refere à dimensão subjetiva encontram-se, por exemplo, a vocação e a auto-realização.
Percebeu-se também as alternativas de combate ao mal-estar, em geral, não são analisadas articuladas às políticas educacionais, apesar de as mesmas influenciarem diretamente o trabalho docente e funcionarem como catalizadores da intensificação e precarização do trabalho dos professores. Acreditamos que a tentativa de diminuição do mal-estar está diretamente ligada à implantação ou não das políticas educacionais.
Apesar das inúmeras pesquisas existentes sobre o mal-estar docente, as alternativas para a diminuição dos mesmos não costumam ser abordadas com a mesma regularidade que é tratada as causas para o mal-estar. Como consequência, o mesmo ainda continua sendo uma realidade entre os profissionais em exercício na educação básica.
Nesse sentido, acreditamos ser pertinente a realização de mais estudos sobre o tema, articulando-o com as políticas públicas e educacionais. Por fim, essa etapa de pesquisa foi importante para compreendermos o que as teses e dissertações revelam sobre as alternativas para a diminuição do mal-estar docente para que possamos dar continuidade a nossa dissertação que abordará a questão do mal-estar e trabalho docente na escola de tempo integral.
Referências
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Notas